5.16.2006

Eduardo Prado Coelho e " A arte de Perder"

Eduardo Prado Coelho sobre “a Arte de perder”. Bem a propósito dado o frenesim de alguns, é importante que saibamos encarar as diferentes derrotas da nossa vida e, bem mais relevante, aprender com elas. A arte de saber perder é directamente proporcional à maturidade e inteligência, evitando-nos a tolice das birras da nossa infância e adolescência.


“A arte de perder
Eduardo Prado Coelho o fio do horizonte
Tantas coisas que perdemos ao longo de uma vida!Perdemos as casas onde vivemos, que habitámos por dentro, naquilo que uma casa tem de mais dentro de si mesma. Perdi a casa de infância dos meus pais na adolescência - no mesmo ritmo que os perdi. Perdi a casa da Avenida do Uruguai, a casa da Rua de Entrecampos, a casa do Lumiar, que os meus pais me ofereceram, a casa do Marais, em Paris, onde vivi dez anos, a casa da Parede. Cada casa corresponde a um ritmo de vida, uma forma de cadência do quotidiano. Mas perdi-as e encontrei outros lugares.Perdi lugares. Cafés - tantos - onde estudava: perdi a Granfina e o Nova Iorque, perdi o Vavá de que tanto gostava, povoado de amigos e cúmplices, perdi o Monte Carlo e raramente volto ao Toni dos Bifes, onde o Carlos de Oliveira ou o Abelaira se encontravam. Perdi um pouco o hábito regular de ir à Versalhes. Perdi a Faculdade de Letras e o seu bar fumarento e ruidoso, invadido por vagas de alunos de Direito. Perdi o Estádio Universitário, o dos plenários do movimento de estudantes, onde falavam o Jorge Sampaio ou o Eurico de Figueiredo. Perdi o bar do Estádio Universitário, para onde ia estudar, mal chegava a Primavera. Perdi a casa de gelados Monte Branco, ali ao Saldanha, para onde ia ler e escrever nas noites de Verão. Perdi a praia de São Martinho do Porto, a praia dos primeiros namoros. Não a reconheço, porque fui reencontrá-la massacrada por uma urbanização selvagem e incomodativa. Encontrei a foz do Arelho.Perdi Paris, o Centro Pompidou, os cinemas do boulevard Saint-Germain, os cafés La Hune e Les Deux Magots, as livrarias Le Divan, que já não existe, e La Hune. Perdi o Teatro de la Ville, onde vi espectáculos magníficos, descobri muito da dança contemporânea, e encontrei pela primeira vez a Pina Bausch. Perdi o Châtelet (o Castelinho, como gostava de dizer o Pierre), onde tive a revelação de William Forsythe e de Bob Wilson. Perdi La Gamin de Paris, no Marais, assim como a livraria (asfixiada economicamente com a guerra do Golfo) ou a pequena loja de discos de música clássica. Perdi o quiosque de Saint-Paul, onde ia todas as manhãs com o meu cão Spinoza, e este aguardava sempre com impaciência que a dona do quiosque lhe desse o brioche que estava tacitamente prometido.Perdi amigos, muitos. O Zé Ribeiro da Fonte, a Margarida Vieira Mendes, o Alberto aparecem por vezes nos meus sonos. Perdi mulheres, muitas, algumas no Brasil, outras em Portugal. Perdi livros, que ficaram noutras casas, que desapareceram sem que eu saiba porquê, que emprestei e não recuperei. Perdi também alguma memória de tudo o que perdi.Mas há um poema de Elizabeth Bishop que se chama precisamente "Uma arte" e é sobre essa difícil arte de perder. Diz assim: "A arte de perder não é nenhum mistério; / tantas coisas contém em si o acidente / de perdê-las, que perder não é nada sério. (...) Perdi duas cidades lindas. E um império / que era meu, dois rios e mais um continente. / Tenho saudades deles. Mas não é nada sério. // Mesmo perder você (a voz, o ar etéreo / que eu amo) não muda nada. Pois é evidente / que a arte de perder não chega a ser mistério / por muito que pareça (Escreve!) muito sério."

Professor universitário”
Eduardo Prado Coelho em
Público, 16 de Maio de 2006

1 comentário:

XYZ disse...

A "arte de perder" de EPC é, como quase sempre, a arte de se engalanar numa prosápia feita de luxos caros e dum enorme (enormíssimo!...) egocentrismo de catedrático oportunista filho de catedrático ultra prestigiado.
Se este alto "professeur" não tivesse nascido numa dessas casas notórias que perdeu, no bom berço que o deu à luz, o que faria agora?
Recordaria assim Paris e as mulheres (tantas???) que diz ter perdido (e não explica como "ganhou")?
Se calhar era um desses amaldiçoados professores "culpados" do trágico sistema de ensino em Portugal, onde as ministras bebem do fino e cospem de alto!!!...
Caro "sounds & whispers", o seu blog tem bom gosto e certo charme.
Mas EPC e os seus ademanes é quase pior (ou tão mau) como as "interjeições serôdias da própria Clara Ferreira Alves"...
Saúde!...