O Portugal tacanho e subdesenvolvido, do tempo da outra senhora, vai-nos render 700 mihões de euros.
Pelos vistos José Sócrates vai vender hoje uma parte significativa da participação Portuguesa na central de Cahora Bassa ao governo Moçambicano.
José Sócrates teceu a este respeito uma afirmação relevantíssima:
"É um dia histórico para Moçambique e para os moçambicanos, mas também muito importante para Portugal".
Sim, Portugal vai conseguir embolsar algum dinheiro para os cofres. Quem achar que eu estou a ver mal o assunto que me desminta.
Um banquete de Estado, na noite de hoje, encerra a visita de Sócrates a Maputo, regressando logo de seguida a Lisboa.
Desta vez não há jogging...
10.31.2006
10.29.2006
Para mim, provavelmente o maior Português de sempre.
Porque nos fez acreditar e sonhar muito para além deste minúsculo rectângulo. E nisso foi único! Conseguiu que deixassemos de nos centrar nos nossos umbigos (e nos nossos eternos inimigos e vizinhos). É o principal responsável pelo nosso melhor e maior período da história. Foi por causa do Infante que tivemos um Luís de Camões com alguma coisa para cantar... Sim, porque o poeta até poderia ser bom, mas teriam de remar sem inspiração para outras paragens.
Para não falar numa longa cascata de acontecimentos que nos trouxe ao que hoje somos! Para o bem e para o mal...
10.26.2006
Olha o Balão!
Inspirado numa bola de sabão, Bartolomeu de Gusmão inventou o balão de ar quente. É o precursor mundial da história da aerostação. Depois de duas tentativas, conseguiu que o balão voasse da Casa da Índia, em Lisboa, até ao Terreiro do Paço, sob olhares incrédulos. Entrou para a história. Espírito inquieto e inventivo, viajou pela Europa e fez novas experiências. Mas nunca foi compreendido. Um homem com uma ideia nova é um excêntrico até que ela resulte… “As pessoas não tinham visão para perceber o que ele fazia”, diz a jornalista Rosário Sá Coutinho.
http://www.rtp.pt/wportal/sites/tv/grandesportugueses/index.php
http://www.rtp.pt/wportal/sites/tv/grandesportugueses/index.php
10.23.2006
Sócrates
10.22.2006
O Socrates que temos!!!
Conforme afirmei num post anterior a Clínica Los Arcos, com apoio e subsídio do Estado Porto, vai-se instalar em Portugal. No Porto, terá as suas instalações na avenida da Boavista.
Considerando que ocorre por esse País o fecho de maternidades, e que o número de intervenções efectuadas pelas clínicas privadas com subsídio do estado é reduzido, não deixa de ser uma medida interessante.
Quero também manifestar aqui o meu espanto para as alterações ao subsídio de viuvez na reforma da segurança social. Utilizando as frases do Eng. José Sócrates em Nelas, aonde também foi como Primeiro-Ministro ( grande confusão de identidades) tudo estava no programa do governo.
Leia-se que no programa do governo vinha algo como
"- a atribuição de ênfase às políticas de apoio às situações mais gravosas de viuvez, orfandade e de crianças em situação de risco"
Suponho que o ênfase é isto: retirar o subsídio de viuvez do conjugue.
Mas de facto vai tudo na mesma onda das SCUTS. As Scuts, quem pode esquecer o que Sócrates, deputado e líder do PS no oposição disse sobre a introdução de portagens nas SCUTS.
Pois TODOS NÓS nos lembramos. Pois que este senhor, acha que todos nós somos ESTÚPIDOS. De facto, foi na sequência deste tema que afirmou que tudo estava no programa de governo: “As SCUTS são importantes nas zonas mais atrasadas do país”.
Seguindo o raciocínio do então ( e só) líder do PS e candidato a primeiro ministro, não queria dizer nada do que afirmava a boca cheia. Pelos vistos e parafraseando o mesmo discurso nós é que fomos burros e não percebemos que eles nos estavam a enganar e nunca tinham escrito no programa que não introduziam portagens.
É bom saber que com este jovem nos temos não só de nos preocupar com as entrelinhas.
Temos que ver o que está escrito relativamente à EDP com a qual fomos atacados. Sim, porque não passamos de uns gastadores e temos o preço da electricidade que merecemos. Ora tomem.
O outro- Guterres- tinha ar de padreco. Este –Sócrates-, ainda aguarda uma classificação à maneira. O futuro o dirá.
Considerando que ocorre por esse País o fecho de maternidades, e que o número de intervenções efectuadas pelas clínicas privadas com subsídio do estado é reduzido, não deixa de ser uma medida interessante.
Quero também manifestar aqui o meu espanto para as alterações ao subsídio de viuvez na reforma da segurança social. Utilizando as frases do Eng. José Sócrates em Nelas, aonde também foi como Primeiro-Ministro ( grande confusão de identidades) tudo estava no programa do governo.
Leia-se que no programa do governo vinha algo como
"- a atribuição de ênfase às políticas de apoio às situações mais gravosas de viuvez, orfandade e de crianças em situação de risco"
Suponho que o ênfase é isto: retirar o subsídio de viuvez do conjugue.
Mas de facto vai tudo na mesma onda das SCUTS. As Scuts, quem pode esquecer o que Sócrates, deputado e líder do PS no oposição disse sobre a introdução de portagens nas SCUTS.
Pois TODOS NÓS nos lembramos. Pois que este senhor, acha que todos nós somos ESTÚPIDOS. De facto, foi na sequência deste tema que afirmou que tudo estava no programa de governo: “As SCUTS são importantes nas zonas mais atrasadas do país”.
Seguindo o raciocínio do então ( e só) líder do PS e candidato a primeiro ministro, não queria dizer nada do que afirmava a boca cheia. Pelos vistos e parafraseando o mesmo discurso nós é que fomos burros e não percebemos que eles nos estavam a enganar e nunca tinham escrito no programa que não introduziam portagens.
É bom saber que com este jovem nos temos não só de nos preocupar com as entrelinhas.
Temos que ver o que está escrito relativamente à EDP com a qual fomos atacados. Sim, porque não passamos de uns gastadores e temos o preço da electricidade que merecemos. Ora tomem.
O outro- Guterres- tinha ar de padreco. Este –Sócrates-, ainda aguarda uma classificação à maneira. O futuro o dirá.
10.18.2006
A Batalha do Rivoli
Reza a história que a batalha do Rivoli foi ganha graças à chegada de Napoleão com as suas tropas.
Aqui está um quadro da época, referente á Batalha do Riovoli, tipicamente neoclassico ao gosto de Napoleão. Graças a esta vitória, a cidade de Viena de Áustria muda de mãos.
Na história do nosso Rivoli, quem será o Napoleão?
10.16.2006
Grandes Portugueses
Por Vasco Pulido Valente, no público.
Não resisto a meter a minha colherada na pequena "polémica" que o concurso da RTP, Os Grandes Portugueses, conseguiu provocar. Como toda a gente já sabe o objectivo do concurso é escolher o "maior português de sempre" por voto público, ou seja, na prática, por telefonema e pela Internet. Parece que a RTP forneceu uma lista de duas centenas de beneméritos, da qual excluiu Salazar e Caetano. Houve logo quem protestasse, com alguma pertinência e muita conversa inútil. A RTP, que não se excita por tão pouco, deu o dito por não dito e mandou fazer um cartaz de propaganda, com D. Afonso Henriques de um lado e Amália Rodrigues do outro. Com toda a razão, de resto. Se Portugal não mudar, por um repentino acto do Altíssimo, ganha provavelmente um deles. Porquê?
Em Inglaterra ganhou Churchill, seguido de muito perto pela princesa Diana. Em França, numa sessão que por acaso vi, ganhou de Gaulle, à justa, contra um cómico sem graça, Coluche, e Edith Piaff, um equivalente de Amália. E em Portugal? Em Portugal não pode ganhar nenhum político, porque nenhum político tem o prestígio nacional unânime, e ainda vivo, de Churchill e de Gaulle (em França, por exemplo, Luís XIV e Napoleão vieram significativamente muito abaixo). D. João I, D. João II e Nun"Álvares talvez não fizessem má figura se alguém os conhecesse, mas ninguém os conhece. Da época heróica da expansão, e apesar da "Via", o Infante D. Henrique e Vasco da Gama não dizem quase nada ao cidadão comum. E dos conquistadores, D. Afonso de Albuquerque ou D. João de Castro, nem vale a pena falar. O Império não está em favor.
Na parte "séria" fica a religião e a arte. Quanto à religião, os nossos santinhos ou nunca existiram, ou se foram embora, ou não nasceram cá. Só a irmã Lúcia é uma candidata forte, se por acaso a RTP a meteu na lista. Do lado da arte, sem arquitectura, sem pintura, sem teatro e sem música, existe Camões, com uma vaga hipótese. Mesmo Camilo, Eça e Pessoa não contam. Suspeito que Saramago, por causa do Nobel, lhes passa à frente. Sobram, portanto, o espectáculo e o desporto. Sobram, em suma, Amália, Eusébio e Figo. Suponho que o público do telefonema e da Internet irá preferir Amália a Eusébio e a Figo por uma questão de respeitabilidade. E também por isso acabará por eleger Afonso Henriques, que é um mero nome, não choca a cultura dominante e disfarça satisfatoriamente a inanidade da Pátria. O concurso Os Grandes Portugueses vai ser um belo retrato dos portugueses de hoje.
Não resisto a meter a minha colherada na pequena "polémica" que o concurso da RTP, Os Grandes Portugueses, conseguiu provocar. Como toda a gente já sabe o objectivo do concurso é escolher o "maior português de sempre" por voto público, ou seja, na prática, por telefonema e pela Internet. Parece que a RTP forneceu uma lista de duas centenas de beneméritos, da qual excluiu Salazar e Caetano. Houve logo quem protestasse, com alguma pertinência e muita conversa inútil. A RTP, que não se excita por tão pouco, deu o dito por não dito e mandou fazer um cartaz de propaganda, com D. Afonso Henriques de um lado e Amália Rodrigues do outro. Com toda a razão, de resto. Se Portugal não mudar, por um repentino acto do Altíssimo, ganha provavelmente um deles. Porquê?
Em Inglaterra ganhou Churchill, seguido de muito perto pela princesa Diana. Em França, numa sessão que por acaso vi, ganhou de Gaulle, à justa, contra um cómico sem graça, Coluche, e Edith Piaff, um equivalente de Amália. E em Portugal? Em Portugal não pode ganhar nenhum político, porque nenhum político tem o prestígio nacional unânime, e ainda vivo, de Churchill e de Gaulle (em França, por exemplo, Luís XIV e Napoleão vieram significativamente muito abaixo). D. João I, D. João II e Nun"Álvares talvez não fizessem má figura se alguém os conhecesse, mas ninguém os conhece. Da época heróica da expansão, e apesar da "Via", o Infante D. Henrique e Vasco da Gama não dizem quase nada ao cidadão comum. E dos conquistadores, D. Afonso de Albuquerque ou D. João de Castro, nem vale a pena falar. O Império não está em favor.
Na parte "séria" fica a religião e a arte. Quanto à religião, os nossos santinhos ou nunca existiram, ou se foram embora, ou não nasceram cá. Só a irmã Lúcia é uma candidata forte, se por acaso a RTP a meteu na lista. Do lado da arte, sem arquitectura, sem pintura, sem teatro e sem música, existe Camões, com uma vaga hipótese. Mesmo Camilo, Eça e Pessoa não contam. Suspeito que Saramago, por causa do Nobel, lhes passa à frente. Sobram, portanto, o espectáculo e o desporto. Sobram, em suma, Amália, Eusébio e Figo. Suponho que o público do telefonema e da Internet irá preferir Amália a Eusébio e a Figo por uma questão de respeitabilidade. E também por isso acabará por eleger Afonso Henriques, que é um mero nome, não choca a cultura dominante e disfarça satisfatoriamente a inanidade da Pátria. O concurso Os Grandes Portugueses vai ser um belo retrato dos portugueses de hoje.
10.15.2006
MIT, 65 milhões de Euros e o direito à indignação (Parte I)
Pergunto-me como um dia acabará tudo isto.
Tudo me faz lembrar outra histórias outros tempos, um culto da personalidade nunca visto. Será que é preciso insultar tudo e todos para se ser popular?
Como é possível desrespeitar tanto as instituições que se representa - As Universidades. E não só...- os investigadores.
Como é possível viver num estado de direito onde todos, aparentemente, obedecem a ordens sem questionar de que se trata.
O primeiro ministro diz:
"ponto de viragem na sociedade e nas comunidades académica e científicas do país". Cavaco Silva elogia "aposta na excelência".
Alguém me sabe explicar este número???? Acreditam que ninguém foi capaz de dar uma explicação cabal sobre o MIT a ninguém. E por mais incrível que pareça ninguém vive muito incomodado com isso.
A minha interpretação desta indiferença só pode ser porque:
1- Somos todos estúpidos e ninguém consegue perceber aonde está o problema.
2- O problema obviamente existe mas eu sou muito mediocre pelo que tenho de estar na linha da frente a dizer que sim para a eventualidade de se lembrarem da minha pessoa (e/ou de quem eu represento) e poder receber algum dinheiro, visita do ministro Gago, da televisão ( o que quer que seja).
Pelos vistos este senhor, Presidente do Conselho de Reitores desconhecia de todo de que se tratava. Apenas tinha sido convocado para ali estar presente... Mas justiça seja feita. Manifestou a sua indignação!
Agradecia que quem pudesse prestar qualquer tipo de esclarecimento me enviasse um mail a explicar...
10.06.2006
10.05.2006
Momento de Humor
Ontem estive indecisa em escrever e descrever um momento de humor com a nossa revista online, Ciência Hoje. Sim, a primeira notícia sobre o Nobel foi
Para quem não se tenha apercebido existe uma pequena troca de nomes entre Robert e Roger. Este engano sem importância nenhuma foi corrigido ao fim de algumas horitas. Não sei se com ou sem ajuda. Enfim, resolvo não falar sobre isto porque, caso contrário, tenho o Jorge Massada a dizer que eu me diverto a dizer mal dele pelos blogs,anonimamente.
Não de facto não vou escrever sobre mais uma das brilhantes gaffes.
Encontrei em vez disso um site assumidamente cómico que publica cómics cientificos, dos quais vou começar a escolher um ou outro.
Aqui vai o primeiro:
Para quem não se tenha apercebido existe uma pequena troca de nomes entre Robert e Roger. Este engano sem importância nenhuma foi corrigido ao fim de algumas horitas. Não sei se com ou sem ajuda. Enfim, resolvo não falar sobre isto porque, caso contrário, tenho o Jorge Massada a dizer que eu me diverto a dizer mal dele pelos blogs,anonimamente.
Não de facto não vou escrever sobre mais uma das brilhantes gaffes.
Encontrei em vez disso um site assumidamente cómico que publica cómics cientificos, dos quais vou começar a escolher um ou outro.
Aqui vai o primeiro:
10.04.2006
Baratas premiadas pela revista Science.
PHOTOGRAPHY: SECOND PLACE
Cockroach Portrait
David Yager*
Figure 2
Cockroach haters, look your enemy in the eye! Photographing small animals like this 2-centimeter-long Cuban banana cockroach, Panchlora nivea, has its challenges: You can focus on only a small part of the tiny animal in one shot. To overcome this drawback, David Yager of the University of Maryland, College Park, relied on technologies old and new. He laid the dead roach on its back on a bed of glass beads and took multiple snapshots at different depths of field through a regular dissecting microscope. Each frame focused on different parts of the roach's head. With three light tubes, he lit the roach's face from various angles and peeked into its head. Next, he merged 12 separate frames using image-processing software called Automontage to create a clear and detailed "Cockroach Portrait."
http://www.blogger.com/post-create.g?blogID=16554740
As conquistas no médio oriente- História
Who has controlled the Middle East over the course of history? Pretty much everyone. Egyptians, Turks, Jews, Romans, Arabs, Greeks, Persians, Europeans...the list goes on. Who will control the Middle East today? That is a much bigger question.
Visite o link:
http://www.mapsofwar.com/ind/imperial-history.html
Visite o link:
http://www.mapsofwar.com/ind/imperial-history.html
10.03.2006
Finlmente, o discurso na integra.
Finalmente, consegui encontra o discurso alvo de toda a polémica.
http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/speeches
/2006/september/documents/
hf_ben-xvi_spe_20060912_university-regensburg_po.html
Publico-o aqui para que todos possamos discutir a fonte e não os comentários sobre o que dizem que foi dito. Esta é uma piada para alguns que me lêem.
Eu gosto de falar com conhecimento de causa.
DISCURSO DO SANTO PADRE
AOS REPRESENTANTES DO MUNDO CIENTÍFICO
E CULTURAL DA BAVIERA NA AULA MAGNA
DA UNIVERSIDADE DE REGENSBURG
Terça-feira, 12 de Setembro de 2006
"Fé, razão e universidade. Recordações e reflexões"
Eminências
Magnificências
Excelências
Ilustres Senhores
Gentis Senhoras
É para mim um momento emocionante encontrar-me de novo na universidade e poder mais uma vez pronunciar uma lição. Os meus pensamentos, contemporaneamente, voltam àqueles anos em que, depois de um grande período passado no Instituto superior de Freising, comecei a minha actividade de professor académico na universidade de Bonn. Era em 1959 ainda o tempo da velha universidade dos professores ordinários. Para cada uma das cátedras não existiam nem assistentes nem dactilógrafos, mas em compensação havia um contacto muito directo com os estudantes e sobretudo também entre os professores. Encontrávamo-nos primeiro e depois das lições nas salas dos professores. Os contactos com os historiadores, os filósofos, os filólogos e naturalmente também entre as duas faculdades teológicas eram muito estreitos. Uma vez por semestre fazia-se o chamado dies academicus, no qual professores de todas as faculdades se apresentavam diante dos estudantes de toda a universidade, tornando assim possível uma experiência de universitas uma coisa à qual também o Senhor, Magnífico Reitor, se referiu há pouco isto é, a experiência, o facto de que nós não obstante todas as especializações, que por vezes nos tornam incapazes de comunicar entre nós, formamos um todo e trabalhamos no todo da única razão com as suas várias dimensões, estando assim juntos também na responsabilidade comum pelo recto uso da razão este facto torna-se experiência viva.
Sem dúvida, a universidade era orgulhosa também das suas duas faculdades teológicas. Era claro que também elas, interrogando-se sobre a racionalidade da fé, desempenham uma obra que necessariamente faz parte do "todo" da universitas scientiarum, mesmo se nem todos podiam partilhar a fé, para cuja co-relação com a razão comum se comprometem os teólogos. Esta unidade interior no universo da razão não foi perturbada nem sequer quando certa vez filtrou a notícia de que um dos colegas dissera que na nossa universidade havia algo de anormal: duas faculdades que se ocupavam de uma coisa que não existia de Deus. Que mesmo perante um cepticismo tão radical seja necessário e normal interrogar-se sobre Deus através da razão e isto deva ser feito no contexto da tradição da fé cristã: no conjunto da universidade, isto era uma convicção fora de questão.
Tudo me voltou à mente, quando li a parte publicada pelo professor Theodore Khoury (Münster) do diálogo que o douto imperador bizantino Manuel II, Paleólogo, talvez durante os meses do Inverno de 1391 em Ankara, teve com um persa culto sobre cristianismo e islão e sobre a verdade de ambos. Talvez tenha sido depois o próprio imperador quem escreveu, durante o assédio de Constantinopla entre 1394 e 1402, este diálogo; explica-se assim por que os seus raciocínios sejam referidos de modo muito mais pormenorizado do que os do seu interlocutor persa. O diálogo alarga-se sobre todo o âmbito das estruturas da fé contidas na Bíblia e no Alcorão e detém-se sobretudo sobre a imagem de Deus e do homem, mas necessariamente também sempre de novo sobre a relação entre as como se dizia três "Leis" ou três "ordens de vida": Antigo Testamento, Novo Testamento, Alcorão. Não desejo falar disto nesta lição; gostaria de tratar só um assunto bastante marginal na estrutura de todo o diálogo que, no contexto do tema "fé e razão", me fascinou e me servirá como ponto de partida para as minhas reflexões sobre este tema.
No sétimo colóquio (διάλεξις, controvérsia) publicado pelo Prof. Khoury, o imperador enfrenta o tema da jihād, da guerra santa. Certamente o imperador sabia que na sua sura 2, 256 se lê: "Nenhuma coacção nas coisas de fé". É uma das suras do período inicial, dizem os peritos, em que o próprio Maomé ainda não tinha poder e estava ameaçado. Mas, naturalmente, o imperador conhecia também as disposições, desenvolvidas sucessivamente e fixadas no Alcorão, sobre a guerra santa.
Sem se deter em pormenores, como a diferença de tratamento entre os que possuem o "Livro" e os "incrédulos" ele, de modo tão brusco que nos surpreende, dirige-se ao seu interlocutor simplesmente com a pergunta central sobre a relação entre religião e violência em geral, dizendo: "Mostra-me também o que Maomé trouxe de novo, e encontrarás apenas coisas más e desumanas, como a sua ordem de difundir através da espada a fé que ele pregava".
O imperador, depois de se ter pronunciado de modo tão duro, explica minuciosamente as razões pelas quais a difusão da fé mediante a violência é irracional. A violência está em contraste com a natureza de Deus e a natureza da alma. "Deus não se apraz com o sangue diz ele não agir segundo a razão "σὺν λόγω", é contrário à natureza de Deus. A fé é fruto da alma, não do corpo. Por conseguinte, quem quiser levar alguém à fé precisa da capacidade de falar bem e de raciocinar correctamente, e não da violência e da ameaça... Para convencer uma alma racional não é necessário dispor nem do próprio braço, nem de instrumentos para ferir nem de qualquer outro meio com o qual se possa ameaçar de morte uma pessoa...".
A afirmação decisiva nesta argumentação contra a conversão mediante a violência é: não agir segundo a razão é contrário à natureza de Deus. O editor, Theodore Khoury, comenta: para o imperador, sendo um bizantino que cresceu na filosofia grega, esta afirmação é evidente. Para a doutrina muçulmana, ao contrário, Deus é absolutamente transcendente. A sua vontade não está relacionada com nenhuma das nossas categorias, mesmo que fosse a da racionalidade. Neste contexto Khoury cita uma obra do conhecido islamita francês R. Arnaldez, o qual ressalta que Ibn Hazm chega a declarar que Deus não estaria relacionado nem sequer com a sua própria palavra e que nada o obrigaria a revelar a nós a verdade. Se fosse a sua vontade, o homem deveria praticar também a idolatria.
A este ponto abre-se, na compreensão de Deus e por conseguinte na realização concreta da religião, um dilema que hoje nos desafia de maneira muito directa. A convicção de que agir contra a razão esteja em contradição com a natureza de Deus, é apenas um pensamento grego ou é sempre válido e por si mesmo? Penso que neste ponto se manifeste a profunda concordância entre o que é grego no sentido melhor e o que é fé em Deus sobre o fundamento da Bíblia. Modificando o primeiro versículo do Livro do Génesis, o primeiro versículo de toda a Sagrada Escritura, João iniciou o prólogo do seu Evangelho com as palavras: "No princípio era o λόγος". É precisamente esta a mesma palavra que o imperador usa: Deus age "σὺν λόγω", com logos. Logos significa ao mesmo tempo razão e palavra uma razão que é criadora e capaz precisamente de se comunicar mas como razão. Com isto João deu-nos a palavra conclusiva sobre o conceito bíblico de Deus, a palavra na qual todos os caminhos muitas vezes cansativos e sinuosos da fé bíblica alcançam a sua meta, encontram a sua síntese.
No princípio era o logos, e o logos é Deus, diz-nos o evangelista. O encontro entre a mensagem bíblica e o pensamento grego não era um simples caso. A visão de São Paulo, diante da qual se tinham fechado os caminhos da Ásia e que, em sonho, viu um Macedónio e ouviu a sua súplica: "Vem para a Macedónia e ajuda-nos" (cf. Act 16, 6-10) esta visão pode ser interpretada como uma "condensação" da necessidade intrínseca de uma aproximação entre fé bíblica e o interrogar-se grego.
Na realidade, esta aproximação já tinha sido iniciada desde há muito tempo. Já o nome misterioso de Deus na sarça ardente, que afasta este Deus do conjunto das divindades com numerosos nomes afirmando apenas o seu "Eu sou", o seu ser, é, em relação ao mito, uma contestação com a qual está em íntima analogia a tentativa de Sócrates de vencer e superar o próprio mito. O processo iniciado na sarça alcança, no Antigo Testamento, uma nova maturidade durante o exílio, onde o Deus de Israel, agora privado da Terra e do culto, se anuncia como o Deus do céu e da terra, apresentando-se com uma simples fórmula que prolonga a palavra da sarça: "Eu sou".
Com este novo conhecimento de Deus caminha em sintonia uma espécie de iluminismo, que se expressa de maneira drástica no escárnio das divindades que seriam apenas obra das mãos do homem (cf. Sl 115). Assim, não obstante toda a dureza do desacordo com os soberanos helenistas, que queriam obter com a força a adaptação ao estilo de vida grego e ao seu culto idolátrico, a fé bíblica, durante a época helenista, ia interiormente ao encontro da parte melhor do pensamento grego, até chegar a um contacto recíproco que depois se realizou especialmente na literatura sapiencial tardia.
Hoje nós sabemos que a tradução grega do Antigo Testamento, realizada em Alexandria a "Septuaginta" é mais que uma simples tradução (que talvez se deva avaliar de modo pouco positivo) do texto hebraico: de facto, é um testemunho textual distinto e um especifico e importante passo da história da Revelação, no qual se realizou este encontro de uma forma que para o nascimento do cristianismo e para a sua divulgação teve um significado decisivo. No fundo, trata-se do encontro entre fé e razão, entre autêntico iluminismo e religião. Partindo verdadeiramente da natureza íntima da fé cristã e, ao mesmo tempo, da natureza do pensamento grego já fundido com a fé, Manuel II podia dizer: Não agir "com o logos" é contrário à natureza de Deus.
Honestamente é preciso anotar a este ponto que, no final da Idade Média, se desenvolveram na teologia tendências que rompem esta síntese entre espírito grego e espírito cristão. Em contraste com o chamado intelectualismo agostiniano e tomista iniciou com Duns Scott uma orientação voluntária, a qual no fim, nos desenvolvimentos sucessivos, levou à afirmação de que nós de Deus só conheceremos a voluntas ordinata. Para além dela existiria a liberdade de Deus, em virtude da qual Ele teria podido criar e fazer também o contrário de tudo o que efectivamente fez.
Aqui vêem-se posições que, sem dúvida, se podem aproximar às de Ibn Hazm e poderiam conduzir até à imagem de um Deus-Arbítrio, que não está relacionado nem com a verdade nem com o bem. A transcendência e a diversidade de Deus são acentuadas de modo tão exagerado, que também a nossa razão, o nosso sentido do verdadeiro e do bem já não são um verdadeiro espelho de Deus, cujas possibilidades abismais permanecem para nós eternamente inalcançáveis e escondidas por detrás das suas decisões efectivas.
Em contraste com isto, a fé da Igreja sempre se ateve à convicção de que entre Deus e nós, entre o seu eterno Espírito criador e a nossa razão criada exista uma verdadeira analogia, na qual como disse o Concílio Lateranense IV em 1215 sem dúvida as diferenças são infinitamente maiores que as semelhanças, mas contudo não até ao ponto de abolir a analogia e a sua linguagem. Deus não é mais divino pelo facto de que o afastamos para longe de nós num voluntarismo puro e impenetrável, mas o Deus verdadeiramente divino é aquele Deus que se mostrou como logos e como logos agiu e age cheio de amor em nosso favor. Sem dúvida, o amor, como diz Paulo, "ultrapassa" o conhecimento e é por isto capaz de compreender mais do que o simples pensamento (cf. Ef 3, 19), contudo ele permanece o amor do Deus-Logos, para o qual o culto cristão é, como diz ainda Paulo "λογικη λατρεία" um culto que concorda com o Verbo eterno e com a nossa razão (cf. Rm 12, 1).
A aqui mencionada recíproca aproximação interior, que se teve entre a fé bíblica e o interrogar-se sobre o plano filosófico do pensamento grego, é um elemento de importância decisiva não só sob o ponto de vista da história das religiões, mas também sob o ponto de vista da história universal um elemento que nos compromete também hoje. Considerado este encontro, não surpreende que o cristianismo, apesar da sua origem e de alguns seus desenvolvimentos importantes no Oriente, tenha por fim encontrado a sua marca historicamente decisiva na Europa. Podemos expressar isto também inversamente: este encontro, ao qual se acrescenta sucessivamente ainda o património de Roma, criou a Europa e permanece o fundamento do que, com razão, se pode chamar Europa.
À tese que o património grego, criticamente purificado, seja uma parte integrante da fé cristã, opõe-se o requerimento da deselenização do cristianismo um requerimento que desde o início da idade moderna domina de modo crescente a pesquisa teológica. Visto mais de perto, podem-se observar três ondas no programa da deselenização: apesar de estarem relacionadas entre si, elas nas suas motivações e nos seus objectivos são claramente distintas uma da outra.
A deselenização emerge primeiro em ligação com os postulados da Reforma do século XVI. Considerando a tradição das escolas teológicas, os reformadores vêem-se diante de uma sistematização da fé condicionada totalmente pela filosofia, isto é, perante uma determinação da fé a partir de fora em virtude de um modo de pensar que não derivava dela. Assim a fé já não se apresentava como palavra histórica viva, mas como elemento inserido na estrutura de um sistema filosófico.
A sola Scriptura ao contrário procura a forma pura primordial da fé, do modo como está presente originariamente na Palavra bíblica. A metafísica aparece como um pressuposto derivante de outra fonte, da qual é necessário libertar a fé para a fazer voltar a ser totalmente ela mesma. Com a sua afirmação de ter que pôr de lado o pensar para dar espaço à fé, Kant agiu com base neste programa com uma radicalidade imprevisível para os reformadores. Com isto ele ancorou a fé exclusivamente à razão prática, negando-lhe o total acesso à realidade.
A teologia liberal dos séculos XIX e XX trouxe uma segunda onda no programa da deselenização: seu representante eminente é Adolf von Harnack. Durante o tempo dos meus estudos, como nos primeiros anos da minha actividade académica, este programa era fortemente operante também na teologia católica. Como ponto de partida era feita a distinção de Pascal entre o Deus dos filósofos e o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob. No meu discurso em Bonn, em 1959, procurei enfrentar este assunto e não pretendo retomar aqui todo o discurso. Mas gostaria de tentar ressaltar pelo menos em síntese a novidade que caracterizava esta segunda onda de deselenização em relação à primeira.
Como pensamento central sobressai, em Harnack, o regresso simplesmente ao homem Jesus e à sua mensagem simples, que viria antes de todas as teologizações e, precisamente, também antes das helenizações: seria esta mensagem simples que constituiria o verdadeiro ápice do desenvolvimento religioso da humanidade. Jesus teria dado um adeus ao culto em favor da moral. Em conclusão, Ele é representado como pai de uma mensagem moral humanitária.
A finalidade de Harnack no fundo é reconduzir o cristianismo em harmonia com a razão moderna, libertando-o, precisamente, de elementos aparentemente filosóficos e teológicos, como por exemplo a fé na divindade de Cristo e na trindade de Deus.
Neste sentido, a exegese histórico-crítica do Novo Testamento, na sua visão, coloca novamente a teologia no cosmos da universidade: teologia, para Harnack, é algo essencialmente histórico e, portanto, estrictamente científico. O que ela indaga sobre Jesus mediante a critica é, por assim dizer, expressão da razão prática e por conseguinte também sustentável no conjunto da universidade. Na base encontra-se a autolimitação moderna da razão, expressa de maneira clássica nas "críticas" de Kant, que entretanto foi ulteriormente radicalizada pelo pensamento das ciências naturais. Este conceito moderno da razão baseia-se, em síntese, num resumo entre platonismo (cartesianismo) e empirismo, que o sucesso técnico confirmou.
Por um lado pressupõe-se a estrutura matemática da matéria, a sua por assim dizer racionalidade intrínseca, que torna possível compreendê-la e usá-la na sua eficiência concreta: este pressuposto básico e, por assim dizer, o elemento platónico no conceito moderno da natureza. Por outro lado, trata-se da utilizabilidade funcional da natureza para as nossas finalidades, onde só a possibilidade de controlar verdade ou falsidade mediante a experiência fornece a certeza decisiva. O peso entre os dois pólos pode, segundo as circunstâncias, estar mais de uma ou mais da outra parte. Um pensador tão estreitamente positivista como J. Monod declarou-se platónico convicto.
Isto exige duas orientações fundamentais decisivas para a nossa questão. Só o tipo de certezas derivantes da sinergia de matemática e empírica nos permite falar de cientificidade. O que pretende ser ciência deve confrontar-se com este critério. E assim também as ciências que se referem às coisas humanas, como a história, a psicologia, a sociologia e a filosofia procuravam aproximar-se deste cânone da cientificidade. Contudo, é importante para as nossas reflexões o facto de que o método como tal exclui o problema Deus, apresentando-o como um problema acientífico ou pré-científico. Portanto, com isto encontramo-nos diante de uma redução do leque de ciência e razão que é obrigatório pôr em questão.
Voltarei ainda sobre este assunto. Neste momento é suficiente ter presente que, numa tentativa de conservar o carácter de disciplina "científica" da teologia à luz desta perspectiva, do cristianismo restaria apenas um miserável fragmento. Mas devemos dizer mais: se a ciência no seu conjunto é apenas isto, então é o próprio homem que, com isto, sofre uma redução. Mas as interrogações propriamente humanas, isto é, as do "de onde" e do "para onde", os questionamentos da religião e do ethos, não podem encontrar lugar no espaço da razão comum descrita pela "ciência" entendida deste modo e devem ser deslocados no âmbito do subjectivo. O sujeito decide, com base nas suas experiências, o que lhe parece religiosamente sustentável, e a "consciência" subjectiva torna-se portanto a única exigência ética.
Mas, desta forma o ethos e a religião perdem a força de criar uma comunidade e terminam no âmbito da discricionalidade pessoal. Esta é uma condição perigosa para a humanidade: verificamos isto nas patologias ameaçadoras da religião e da razão patologias que necessariamente devem manifestar-se, quando a razão é limitada a tal ponto que as questões da religião e do ethos já não lhe dizem respeito. O que permanece das tentativas de construir uma ética partindo das regras da evolução ou da psicologia e da sociologia, é simplesmente insuficiente.
Antes de chegar às conclusões que todo este raciocínio tem por finalidade, devo mencionar ainda em breve a terceira onda de deselenização que se difunde actualmente. Em consideração do encontro com a multiplicidade das culturas hoje há quem goste de dizer que a síntese com o helenismo, realizada na Igreja antiga, teria sido uma primeira inculturação, que não deveria vincular as outras culturas. Isto deveria ter o direito de retroceder até ao ponto que precedia aquela inculturação para descobrir a simples mensagem do Novo Testamento e inculturá-la depois novamente nos seus respectivos ambientes.
Esta tese não é simplesmente errada; contudo é grosseira e imprecisa. De facto, o Novo Testamento foi escrito em grego e tem em si o contacto com o espírito grego um contacto que se tinha maturado no desenvolvimento precedente do Antigo Testamento. Sem dúvida existem elementos no processo formativo da Igreja antiga que não devem ser integrados em todas as culturas. Mas as decisões de fundo que, precisamente, se referem ao relacionamento da fé com a investigação da razão humana, estas decisões de fundo pertencem à própria fé e são os seus desenvolvimentos, conformes com a sua natureza.
Com isto chego à conclusão. Esta tentativa, feita apenas em linhas gerais, de crítica da razão moderna a partir do seu interior, não inclui absolutamente a opinião de que agora se deva voltar atrás, à época anterior ao iluminismo, rejeitando as convicções da era moderna. Aquilo que no desenvolvimento moderno do espírito é válido, é reconhecido sem hesitações: todos estamos gratos pelas grandiosas possibilidades que ele abriu ao homem e pelos progressos no campo humano que nos foram proporcionados. O ethos da cientificidade, afinal, é como Vossa Magnificência mencionou vontade de obediência à verdade e, por conseguinte, expressão de uma atitude que faz parte das decisões fundamentais do espírito cristão.
Por conseguinte, a intenção não é retracção, nem crítica negativa; ao contrário, trata-se de um alargamento do nosso conceito de razão e do seu uso. Porque com toda a alegria diante das possibilidades do homem, vemos também as ameaças que sobressaem destas possibilidades e devemos perguntar-nos como podemos dominá-las. Só o conseguiremos se razão e fé estiverem unidas de uma nova forma; se superarmos a limitação autodecretada da razão ao que é verificável na experiência, e lhe abrirmos de novo toda a sua vastidão. Neste sentido, a teologia, não só como disciplina histórica e humano-científica, mas como verdadeira teologia, ou seja, como interrogação sobre a razão da fé, deve ter o seu lugar na universidade e no amplo diálogo das ciências.
Só assim nos tornamos também capazes de um verdadeiro diálogo das culturas e das religiões um diálogo do qual temos urgente necessidade. No mundo ocidental domina amplamente a opinião de que só a razão positivista e as formas de filosofia dela derivantes sejam universais. Mas as culturas profundamente religiosas do mundo vêem precisamente nesta exclusão do divino da universalidade da razão um ataque às suas convicções mais íntimas. Uma razão, que diante do divino é surda e rejeita a religião do âmbito das subculturas, é incapaz de se inserir no diálogo das culturas.
Contudo, a razão moderna típica das ciências naturais, com o seu elemento platónico intrínseco, tem em si, como procurei demonstrar, uma pergunta que a transcende juntamente com as suas possibilidades metódicas. Ela mesma deve simplesmente aceitar a estrutura racional da matéria e a correspondência entre o nosso espírito e as estruturas racionais actuantes na natureza como um dado de facto, sobre o qual se baseia o seu percurso metódico. Mas a pergunta acerca do porque deste dado de facto existe e deve ser confiada pelas ciências naturais a outros níveis e modos do pensar à filosofia e à teologia.
Para a filosofia e, de maneira diferente, para a teologia, ouvir as grandes experiências e convicções das tradições religiosas da humanidade, especialmente a da fé crista, constitui uma fonte de conhecimento; recusar-se significaria uma limitação inaceitável do nosso ouvir e responder.
Vêm-me à mente a este ponto uma palavra de Sócrates a Fédon. Nos diálogos precedentes tinham sido tratadas muitas opiniões filosóficas erradas, e então Sócrates diz: "Seria muito compreensível se alguém, devido à irritação por tantas coisas erradas, para o resto da sua vida desprezasse qualquer discurso sobre o ser ou o denegrisse. Mas desta forma perderia a verdade do ser e sofreria um grande dano".
O ocidente, desde há muito tempo, está ameaçado por esta repulsa contra os questionamentos fundamentais da sua razão, e assim poderia sofrer unicamente um grande dano. A coragem de se abrir à vastidão da razão, não a rejeição da sua grandeza este é o programa com que uma teologia comprometida na reflexão sobre a fé bíblica, entra no debate do tempo presente. "Não agir segundo razão, não agir com o logos, é contrário à natureza de Deus", disse Manuel II, partindo da sua imagem cristã de Deus, ao interlocutor persa. Para este grande logos, para esta vastidão da razão, convidamos os nossos interlocutores no diálogo das culturas. Encontrá-la nós próprios sempre de novo, é a grande tarefa da universidade.
http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/speeches
/2006/september/documents/
hf_ben-xvi_spe_20060912_university-regensburg_po.html
Publico-o aqui para que todos possamos discutir a fonte e não os comentários sobre o que dizem que foi dito. Esta é uma piada para alguns que me lêem.
Eu gosto de falar com conhecimento de causa.
DISCURSO DO SANTO PADRE
AOS REPRESENTANTES DO MUNDO CIENTÍFICO
E CULTURAL DA BAVIERA NA AULA MAGNA
DA UNIVERSIDADE DE REGENSBURG
Terça-feira, 12 de Setembro de 2006
"Fé, razão e universidade. Recordações e reflexões"
Eminências
Magnificências
Excelências
Ilustres Senhores
Gentis Senhoras
É para mim um momento emocionante encontrar-me de novo na universidade e poder mais uma vez pronunciar uma lição. Os meus pensamentos, contemporaneamente, voltam àqueles anos em que, depois de um grande período passado no Instituto superior de Freising, comecei a minha actividade de professor académico na universidade de Bonn. Era em 1959 ainda o tempo da velha universidade dos professores ordinários. Para cada uma das cátedras não existiam nem assistentes nem dactilógrafos, mas em compensação havia um contacto muito directo com os estudantes e sobretudo também entre os professores. Encontrávamo-nos primeiro e depois das lições nas salas dos professores. Os contactos com os historiadores, os filósofos, os filólogos e naturalmente também entre as duas faculdades teológicas eram muito estreitos. Uma vez por semestre fazia-se o chamado dies academicus, no qual professores de todas as faculdades se apresentavam diante dos estudantes de toda a universidade, tornando assim possível uma experiência de universitas uma coisa à qual também o Senhor, Magnífico Reitor, se referiu há pouco isto é, a experiência, o facto de que nós não obstante todas as especializações, que por vezes nos tornam incapazes de comunicar entre nós, formamos um todo e trabalhamos no todo da única razão com as suas várias dimensões, estando assim juntos também na responsabilidade comum pelo recto uso da razão este facto torna-se experiência viva.
Sem dúvida, a universidade era orgulhosa também das suas duas faculdades teológicas. Era claro que também elas, interrogando-se sobre a racionalidade da fé, desempenham uma obra que necessariamente faz parte do "todo" da universitas scientiarum, mesmo se nem todos podiam partilhar a fé, para cuja co-relação com a razão comum se comprometem os teólogos. Esta unidade interior no universo da razão não foi perturbada nem sequer quando certa vez filtrou a notícia de que um dos colegas dissera que na nossa universidade havia algo de anormal: duas faculdades que se ocupavam de uma coisa que não existia de Deus. Que mesmo perante um cepticismo tão radical seja necessário e normal interrogar-se sobre Deus através da razão e isto deva ser feito no contexto da tradição da fé cristã: no conjunto da universidade, isto era uma convicção fora de questão.
Tudo me voltou à mente, quando li a parte publicada pelo professor Theodore Khoury (Münster) do diálogo que o douto imperador bizantino Manuel II, Paleólogo, talvez durante os meses do Inverno de 1391 em Ankara, teve com um persa culto sobre cristianismo e islão e sobre a verdade de ambos. Talvez tenha sido depois o próprio imperador quem escreveu, durante o assédio de Constantinopla entre 1394 e 1402, este diálogo; explica-se assim por que os seus raciocínios sejam referidos de modo muito mais pormenorizado do que os do seu interlocutor persa. O diálogo alarga-se sobre todo o âmbito das estruturas da fé contidas na Bíblia e no Alcorão e detém-se sobretudo sobre a imagem de Deus e do homem, mas necessariamente também sempre de novo sobre a relação entre as como se dizia três "Leis" ou três "ordens de vida": Antigo Testamento, Novo Testamento, Alcorão. Não desejo falar disto nesta lição; gostaria de tratar só um assunto bastante marginal na estrutura de todo o diálogo que, no contexto do tema "fé e razão", me fascinou e me servirá como ponto de partida para as minhas reflexões sobre este tema.
No sétimo colóquio (διάλεξις, controvérsia) publicado pelo Prof. Khoury, o imperador enfrenta o tema da jihād, da guerra santa. Certamente o imperador sabia que na sua sura 2, 256 se lê: "Nenhuma coacção nas coisas de fé". É uma das suras do período inicial, dizem os peritos, em que o próprio Maomé ainda não tinha poder e estava ameaçado. Mas, naturalmente, o imperador conhecia também as disposições, desenvolvidas sucessivamente e fixadas no Alcorão, sobre a guerra santa.
Sem se deter em pormenores, como a diferença de tratamento entre os que possuem o "Livro" e os "incrédulos" ele, de modo tão brusco que nos surpreende, dirige-se ao seu interlocutor simplesmente com a pergunta central sobre a relação entre religião e violência em geral, dizendo: "Mostra-me também o que Maomé trouxe de novo, e encontrarás apenas coisas más e desumanas, como a sua ordem de difundir através da espada a fé que ele pregava".
O imperador, depois de se ter pronunciado de modo tão duro, explica minuciosamente as razões pelas quais a difusão da fé mediante a violência é irracional. A violência está em contraste com a natureza de Deus e a natureza da alma. "Deus não se apraz com o sangue diz ele não agir segundo a razão "σὺν λόγω", é contrário à natureza de Deus. A fé é fruto da alma, não do corpo. Por conseguinte, quem quiser levar alguém à fé precisa da capacidade de falar bem e de raciocinar correctamente, e não da violência e da ameaça... Para convencer uma alma racional não é necessário dispor nem do próprio braço, nem de instrumentos para ferir nem de qualquer outro meio com o qual se possa ameaçar de morte uma pessoa...".
A afirmação decisiva nesta argumentação contra a conversão mediante a violência é: não agir segundo a razão é contrário à natureza de Deus. O editor, Theodore Khoury, comenta: para o imperador, sendo um bizantino que cresceu na filosofia grega, esta afirmação é evidente. Para a doutrina muçulmana, ao contrário, Deus é absolutamente transcendente. A sua vontade não está relacionada com nenhuma das nossas categorias, mesmo que fosse a da racionalidade. Neste contexto Khoury cita uma obra do conhecido islamita francês R. Arnaldez, o qual ressalta que Ibn Hazm chega a declarar que Deus não estaria relacionado nem sequer com a sua própria palavra e que nada o obrigaria a revelar a nós a verdade. Se fosse a sua vontade, o homem deveria praticar também a idolatria.
A este ponto abre-se, na compreensão de Deus e por conseguinte na realização concreta da religião, um dilema que hoje nos desafia de maneira muito directa. A convicção de que agir contra a razão esteja em contradição com a natureza de Deus, é apenas um pensamento grego ou é sempre válido e por si mesmo? Penso que neste ponto se manifeste a profunda concordância entre o que é grego no sentido melhor e o que é fé em Deus sobre o fundamento da Bíblia. Modificando o primeiro versículo do Livro do Génesis, o primeiro versículo de toda a Sagrada Escritura, João iniciou o prólogo do seu Evangelho com as palavras: "No princípio era o λόγος". É precisamente esta a mesma palavra que o imperador usa: Deus age "σὺν λόγω", com logos. Logos significa ao mesmo tempo razão e palavra uma razão que é criadora e capaz precisamente de se comunicar mas como razão. Com isto João deu-nos a palavra conclusiva sobre o conceito bíblico de Deus, a palavra na qual todos os caminhos muitas vezes cansativos e sinuosos da fé bíblica alcançam a sua meta, encontram a sua síntese.
No princípio era o logos, e o logos é Deus, diz-nos o evangelista. O encontro entre a mensagem bíblica e o pensamento grego não era um simples caso. A visão de São Paulo, diante da qual se tinham fechado os caminhos da Ásia e que, em sonho, viu um Macedónio e ouviu a sua súplica: "Vem para a Macedónia e ajuda-nos" (cf. Act 16, 6-10) esta visão pode ser interpretada como uma "condensação" da necessidade intrínseca de uma aproximação entre fé bíblica e o interrogar-se grego.
Na realidade, esta aproximação já tinha sido iniciada desde há muito tempo. Já o nome misterioso de Deus na sarça ardente, que afasta este Deus do conjunto das divindades com numerosos nomes afirmando apenas o seu "Eu sou", o seu ser, é, em relação ao mito, uma contestação com a qual está em íntima analogia a tentativa de Sócrates de vencer e superar o próprio mito. O processo iniciado na sarça alcança, no Antigo Testamento, uma nova maturidade durante o exílio, onde o Deus de Israel, agora privado da Terra e do culto, se anuncia como o Deus do céu e da terra, apresentando-se com uma simples fórmula que prolonga a palavra da sarça: "Eu sou".
Com este novo conhecimento de Deus caminha em sintonia uma espécie de iluminismo, que se expressa de maneira drástica no escárnio das divindades que seriam apenas obra das mãos do homem (cf. Sl 115). Assim, não obstante toda a dureza do desacordo com os soberanos helenistas, que queriam obter com a força a adaptação ao estilo de vida grego e ao seu culto idolátrico, a fé bíblica, durante a época helenista, ia interiormente ao encontro da parte melhor do pensamento grego, até chegar a um contacto recíproco que depois se realizou especialmente na literatura sapiencial tardia.
Hoje nós sabemos que a tradução grega do Antigo Testamento, realizada em Alexandria a "Septuaginta" é mais que uma simples tradução (que talvez se deva avaliar de modo pouco positivo) do texto hebraico: de facto, é um testemunho textual distinto e um especifico e importante passo da história da Revelação, no qual se realizou este encontro de uma forma que para o nascimento do cristianismo e para a sua divulgação teve um significado decisivo. No fundo, trata-se do encontro entre fé e razão, entre autêntico iluminismo e religião. Partindo verdadeiramente da natureza íntima da fé cristã e, ao mesmo tempo, da natureza do pensamento grego já fundido com a fé, Manuel II podia dizer: Não agir "com o logos" é contrário à natureza de Deus.
Honestamente é preciso anotar a este ponto que, no final da Idade Média, se desenvolveram na teologia tendências que rompem esta síntese entre espírito grego e espírito cristão. Em contraste com o chamado intelectualismo agostiniano e tomista iniciou com Duns Scott uma orientação voluntária, a qual no fim, nos desenvolvimentos sucessivos, levou à afirmação de que nós de Deus só conheceremos a voluntas ordinata. Para além dela existiria a liberdade de Deus, em virtude da qual Ele teria podido criar e fazer também o contrário de tudo o que efectivamente fez.
Aqui vêem-se posições que, sem dúvida, se podem aproximar às de Ibn Hazm e poderiam conduzir até à imagem de um Deus-Arbítrio, que não está relacionado nem com a verdade nem com o bem. A transcendência e a diversidade de Deus são acentuadas de modo tão exagerado, que também a nossa razão, o nosso sentido do verdadeiro e do bem já não são um verdadeiro espelho de Deus, cujas possibilidades abismais permanecem para nós eternamente inalcançáveis e escondidas por detrás das suas decisões efectivas.
Em contraste com isto, a fé da Igreja sempre se ateve à convicção de que entre Deus e nós, entre o seu eterno Espírito criador e a nossa razão criada exista uma verdadeira analogia, na qual como disse o Concílio Lateranense IV em 1215 sem dúvida as diferenças são infinitamente maiores que as semelhanças, mas contudo não até ao ponto de abolir a analogia e a sua linguagem. Deus não é mais divino pelo facto de que o afastamos para longe de nós num voluntarismo puro e impenetrável, mas o Deus verdadeiramente divino é aquele Deus que se mostrou como logos e como logos agiu e age cheio de amor em nosso favor. Sem dúvida, o amor, como diz Paulo, "ultrapassa" o conhecimento e é por isto capaz de compreender mais do que o simples pensamento (cf. Ef 3, 19), contudo ele permanece o amor do Deus-Logos, para o qual o culto cristão é, como diz ainda Paulo "λογικη λατρεία" um culto que concorda com o Verbo eterno e com a nossa razão (cf. Rm 12, 1).
A aqui mencionada recíproca aproximação interior, que se teve entre a fé bíblica e o interrogar-se sobre o plano filosófico do pensamento grego, é um elemento de importância decisiva não só sob o ponto de vista da história das religiões, mas também sob o ponto de vista da história universal um elemento que nos compromete também hoje. Considerado este encontro, não surpreende que o cristianismo, apesar da sua origem e de alguns seus desenvolvimentos importantes no Oriente, tenha por fim encontrado a sua marca historicamente decisiva na Europa. Podemos expressar isto também inversamente: este encontro, ao qual se acrescenta sucessivamente ainda o património de Roma, criou a Europa e permanece o fundamento do que, com razão, se pode chamar Europa.
À tese que o património grego, criticamente purificado, seja uma parte integrante da fé cristã, opõe-se o requerimento da deselenização do cristianismo um requerimento que desde o início da idade moderna domina de modo crescente a pesquisa teológica. Visto mais de perto, podem-se observar três ondas no programa da deselenização: apesar de estarem relacionadas entre si, elas nas suas motivações e nos seus objectivos são claramente distintas uma da outra.
A deselenização emerge primeiro em ligação com os postulados da Reforma do século XVI. Considerando a tradição das escolas teológicas, os reformadores vêem-se diante de uma sistematização da fé condicionada totalmente pela filosofia, isto é, perante uma determinação da fé a partir de fora em virtude de um modo de pensar que não derivava dela. Assim a fé já não se apresentava como palavra histórica viva, mas como elemento inserido na estrutura de um sistema filosófico.
A sola Scriptura ao contrário procura a forma pura primordial da fé, do modo como está presente originariamente na Palavra bíblica. A metafísica aparece como um pressuposto derivante de outra fonte, da qual é necessário libertar a fé para a fazer voltar a ser totalmente ela mesma. Com a sua afirmação de ter que pôr de lado o pensar para dar espaço à fé, Kant agiu com base neste programa com uma radicalidade imprevisível para os reformadores. Com isto ele ancorou a fé exclusivamente à razão prática, negando-lhe o total acesso à realidade.
A teologia liberal dos séculos XIX e XX trouxe uma segunda onda no programa da deselenização: seu representante eminente é Adolf von Harnack. Durante o tempo dos meus estudos, como nos primeiros anos da minha actividade académica, este programa era fortemente operante também na teologia católica. Como ponto de partida era feita a distinção de Pascal entre o Deus dos filósofos e o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob. No meu discurso em Bonn, em 1959, procurei enfrentar este assunto e não pretendo retomar aqui todo o discurso. Mas gostaria de tentar ressaltar pelo menos em síntese a novidade que caracterizava esta segunda onda de deselenização em relação à primeira.
Como pensamento central sobressai, em Harnack, o regresso simplesmente ao homem Jesus e à sua mensagem simples, que viria antes de todas as teologizações e, precisamente, também antes das helenizações: seria esta mensagem simples que constituiria o verdadeiro ápice do desenvolvimento religioso da humanidade. Jesus teria dado um adeus ao culto em favor da moral. Em conclusão, Ele é representado como pai de uma mensagem moral humanitária.
A finalidade de Harnack no fundo é reconduzir o cristianismo em harmonia com a razão moderna, libertando-o, precisamente, de elementos aparentemente filosóficos e teológicos, como por exemplo a fé na divindade de Cristo e na trindade de Deus.
Neste sentido, a exegese histórico-crítica do Novo Testamento, na sua visão, coloca novamente a teologia no cosmos da universidade: teologia, para Harnack, é algo essencialmente histórico e, portanto, estrictamente científico. O que ela indaga sobre Jesus mediante a critica é, por assim dizer, expressão da razão prática e por conseguinte também sustentável no conjunto da universidade. Na base encontra-se a autolimitação moderna da razão, expressa de maneira clássica nas "críticas" de Kant, que entretanto foi ulteriormente radicalizada pelo pensamento das ciências naturais. Este conceito moderno da razão baseia-se, em síntese, num resumo entre platonismo (cartesianismo) e empirismo, que o sucesso técnico confirmou.
Por um lado pressupõe-se a estrutura matemática da matéria, a sua por assim dizer racionalidade intrínseca, que torna possível compreendê-la e usá-la na sua eficiência concreta: este pressuposto básico e, por assim dizer, o elemento platónico no conceito moderno da natureza. Por outro lado, trata-se da utilizabilidade funcional da natureza para as nossas finalidades, onde só a possibilidade de controlar verdade ou falsidade mediante a experiência fornece a certeza decisiva. O peso entre os dois pólos pode, segundo as circunstâncias, estar mais de uma ou mais da outra parte. Um pensador tão estreitamente positivista como J. Monod declarou-se platónico convicto.
Isto exige duas orientações fundamentais decisivas para a nossa questão. Só o tipo de certezas derivantes da sinergia de matemática e empírica nos permite falar de cientificidade. O que pretende ser ciência deve confrontar-se com este critério. E assim também as ciências que se referem às coisas humanas, como a história, a psicologia, a sociologia e a filosofia procuravam aproximar-se deste cânone da cientificidade. Contudo, é importante para as nossas reflexões o facto de que o método como tal exclui o problema Deus, apresentando-o como um problema acientífico ou pré-científico. Portanto, com isto encontramo-nos diante de uma redução do leque de ciência e razão que é obrigatório pôr em questão.
Voltarei ainda sobre este assunto. Neste momento é suficiente ter presente que, numa tentativa de conservar o carácter de disciplina "científica" da teologia à luz desta perspectiva, do cristianismo restaria apenas um miserável fragmento. Mas devemos dizer mais: se a ciência no seu conjunto é apenas isto, então é o próprio homem que, com isto, sofre uma redução. Mas as interrogações propriamente humanas, isto é, as do "de onde" e do "para onde", os questionamentos da religião e do ethos, não podem encontrar lugar no espaço da razão comum descrita pela "ciência" entendida deste modo e devem ser deslocados no âmbito do subjectivo. O sujeito decide, com base nas suas experiências, o que lhe parece religiosamente sustentável, e a "consciência" subjectiva torna-se portanto a única exigência ética.
Mas, desta forma o ethos e a religião perdem a força de criar uma comunidade e terminam no âmbito da discricionalidade pessoal. Esta é uma condição perigosa para a humanidade: verificamos isto nas patologias ameaçadoras da religião e da razão patologias que necessariamente devem manifestar-se, quando a razão é limitada a tal ponto que as questões da religião e do ethos já não lhe dizem respeito. O que permanece das tentativas de construir uma ética partindo das regras da evolução ou da psicologia e da sociologia, é simplesmente insuficiente.
Antes de chegar às conclusões que todo este raciocínio tem por finalidade, devo mencionar ainda em breve a terceira onda de deselenização que se difunde actualmente. Em consideração do encontro com a multiplicidade das culturas hoje há quem goste de dizer que a síntese com o helenismo, realizada na Igreja antiga, teria sido uma primeira inculturação, que não deveria vincular as outras culturas. Isto deveria ter o direito de retroceder até ao ponto que precedia aquela inculturação para descobrir a simples mensagem do Novo Testamento e inculturá-la depois novamente nos seus respectivos ambientes.
Esta tese não é simplesmente errada; contudo é grosseira e imprecisa. De facto, o Novo Testamento foi escrito em grego e tem em si o contacto com o espírito grego um contacto que se tinha maturado no desenvolvimento precedente do Antigo Testamento. Sem dúvida existem elementos no processo formativo da Igreja antiga que não devem ser integrados em todas as culturas. Mas as decisões de fundo que, precisamente, se referem ao relacionamento da fé com a investigação da razão humana, estas decisões de fundo pertencem à própria fé e são os seus desenvolvimentos, conformes com a sua natureza.
Com isto chego à conclusão. Esta tentativa, feita apenas em linhas gerais, de crítica da razão moderna a partir do seu interior, não inclui absolutamente a opinião de que agora se deva voltar atrás, à época anterior ao iluminismo, rejeitando as convicções da era moderna. Aquilo que no desenvolvimento moderno do espírito é válido, é reconhecido sem hesitações: todos estamos gratos pelas grandiosas possibilidades que ele abriu ao homem e pelos progressos no campo humano que nos foram proporcionados. O ethos da cientificidade, afinal, é como Vossa Magnificência mencionou vontade de obediência à verdade e, por conseguinte, expressão de uma atitude que faz parte das decisões fundamentais do espírito cristão.
Por conseguinte, a intenção não é retracção, nem crítica negativa; ao contrário, trata-se de um alargamento do nosso conceito de razão e do seu uso. Porque com toda a alegria diante das possibilidades do homem, vemos também as ameaças que sobressaem destas possibilidades e devemos perguntar-nos como podemos dominá-las. Só o conseguiremos se razão e fé estiverem unidas de uma nova forma; se superarmos a limitação autodecretada da razão ao que é verificável na experiência, e lhe abrirmos de novo toda a sua vastidão. Neste sentido, a teologia, não só como disciplina histórica e humano-científica, mas como verdadeira teologia, ou seja, como interrogação sobre a razão da fé, deve ter o seu lugar na universidade e no amplo diálogo das ciências.
Só assim nos tornamos também capazes de um verdadeiro diálogo das culturas e das religiões um diálogo do qual temos urgente necessidade. No mundo ocidental domina amplamente a opinião de que só a razão positivista e as formas de filosofia dela derivantes sejam universais. Mas as culturas profundamente religiosas do mundo vêem precisamente nesta exclusão do divino da universalidade da razão um ataque às suas convicções mais íntimas. Uma razão, que diante do divino é surda e rejeita a religião do âmbito das subculturas, é incapaz de se inserir no diálogo das culturas.
Contudo, a razão moderna típica das ciências naturais, com o seu elemento platónico intrínseco, tem em si, como procurei demonstrar, uma pergunta que a transcende juntamente com as suas possibilidades metódicas. Ela mesma deve simplesmente aceitar a estrutura racional da matéria e a correspondência entre o nosso espírito e as estruturas racionais actuantes na natureza como um dado de facto, sobre o qual se baseia o seu percurso metódico. Mas a pergunta acerca do porque deste dado de facto existe e deve ser confiada pelas ciências naturais a outros níveis e modos do pensar à filosofia e à teologia.
Para a filosofia e, de maneira diferente, para a teologia, ouvir as grandes experiências e convicções das tradições religiosas da humanidade, especialmente a da fé crista, constitui uma fonte de conhecimento; recusar-se significaria uma limitação inaceitável do nosso ouvir e responder.
Vêm-me à mente a este ponto uma palavra de Sócrates a Fédon. Nos diálogos precedentes tinham sido tratadas muitas opiniões filosóficas erradas, e então Sócrates diz: "Seria muito compreensível se alguém, devido à irritação por tantas coisas erradas, para o resto da sua vida desprezasse qualquer discurso sobre o ser ou o denegrisse. Mas desta forma perderia a verdade do ser e sofreria um grande dano".
O ocidente, desde há muito tempo, está ameaçado por esta repulsa contra os questionamentos fundamentais da sua razão, e assim poderia sofrer unicamente um grande dano. A coragem de se abrir à vastidão da razão, não a rejeição da sua grandeza este é o programa com que uma teologia comprometida na reflexão sobre a fé bíblica, entra no debate do tempo presente. "Não agir segundo razão, não agir com o logos, é contrário à natureza de Deus", disse Manuel II, partindo da sua imagem cristã de Deus, ao interlocutor persa. Para este grande logos, para esta vastidão da razão, convidamos os nossos interlocutores no diálogo das culturas. Encontrá-la nós próprios sempre de novo, é a grande tarefa da universidade.
10.02.2006
Eleições no Brasil
Neste momento, dizem as projecções, Lula da Silva não será eleito à primeira volta. Muitos dos analistas mostram-se cépticos quanto a uma segunda volta triunfal.
Seria interessante analisarmos, friamente, o que Lula fez no seu mandato e, sobretudo, interrogarmo-nos quanto à facilidade com que alguém que esteve envolvido em sucessivos escândalos, continua a ser o legítimo representante do povo e das classes mais desfavorecidas. Este constitui mais um exemplo de dualidade de critérios. Aparentemente, e isso não ponho em causa, os electrodomésticos que Valentim Loureiro ofereceu aos seus eleitores foram compra de votos; no entanto, os cheques passados por Lula da Silva aos brasileiros mais desfavorecidos caem noutro tipo de classificação.
Fotografia de Lula da Silva. Antes ou depois do Botox?. Não sei.
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